Tuesday, December 28, 2010

Séries Temporais de Balsa

Será possível transformar meia dúzia de caixotes de cacos arqueológicos e duas centenas de peças de museu numa narrativa coerente sobre cinco séculos de história socioeconómica e demográfica de Balsa, uma cidade romana quase desconhecida e desaparecida há já 1500 anos?

Habitualmente os fragmentos de cerâmica, vidro e de outros materiais,  identificados e recolhidos pelos arqueólogos, são laboriosamente classificados, contados e frequentemente desenhados por peritos especializados: os tipologistas de materiais.
Porém, o seu estudo quase nunca vai  além da determinação das percentagens de cada classe; da sua comparação entre sítios diferentes; e do registo de ocorrências de produções originárias de outras regiões, mais ou menos longínquas.


Existe no entanto uma alternativa. Clique na imagem para saber mais.
(documento PDF +5MB)

Monday, October 11, 2010

Cadastro Romano de Balsa

 The Roman Cadastre of Balsa (Lusitania). Empirical evidence and gromatic interpretation

Extractos de conteúdos de palestras

Introdução


Cadastro do território

O cadastro romano dos territórios rurais pertencentes às comunidades urbanas com autonomia municipal (colónias, municípios e equiparadas) foi um instrumento essencial de ordenamento jurídico do solo; de definição dos limites do território da comunidade; de demarcação das parcelas de propriedade; e de arrolamento exaustivo destas para fins fiscais e de registo de direitos prediais.

O modelo geral de ordenamento tinha o seu centro na cidade e definia zonas concêntricas progressivamente afastadas, terminando no limite do território urbano.




Centuriações

O modo mais característico de parcelamento cadastral romano foi o das centuriações, especificamente adaptado a campos de cultivo. A centuriação dividia um território numa quadrícula ortogonal de parcelas rectangulares designadas como centúrias. Cada centúria tinha dimensões constantes e separava-se das centúrias vizinhas por "limites": caminhos rectilíneos idealmente escavados e murados, idênticos às veredas com valados que ainda se encontram em numerosos sítios do Algarve.

Dois eixos correspondentes a limites especiais formavam as origens do sistema de centuriação, orientado para Poente. As centúrias identificavam-se segundo a linha que ocupavam à esquerda (sinistra) (isto é, a Sul) ou à direita (dextra) (isto é, a Norte) do eixo horizontal Este-Oeste (decumanus maximus) e a coluna "para lá" (ultra) (isto é, a Poente) ou "para cá" (citra) (isto é, a Nascente) do eixo vertical Norte-Sul (kardus maximus).

Nos cantos de cada centúria ou nos cruzamentos dos limites dispunham-se marcos e outras estruturas que identificavam a quadrícula segundo a linha e a coluna que ocupava no quadriculado geral.

As centúrias não correspondiam a prédios/propriedades mas a lotes regulares onde estas se estabeleciam. Uma centúria podia conter vários prédios pertencentes a proprietários diferentes e um proprietário podia possuir vários prédios em centúrias diferentes.

De facto, a distribuições de terras fazia-se por sorteio de lotes, que se podiam distribuir por várias centúrias, mas não era igualitária. Distinguiam-se os lotes: da plebe comum (romanos e não romanos); da plebe favorecida (veteranos em assentamentos civis, oficiais e similares); e da aristocracia municipal, em que se destacavam os familiares ou representantes do fundador da colónia ou responsável pela divisão territorial, que era ou um alto dignitário ou alguém da própria família imperial.

Do ponto de vista social agrário, a realização de centuriações correspondia a uma reforma agrária radical, com uma redefinição e redistribuição total das melhores terras com potencialidade agrícola (nomeadamente para culturas arvenses e hortícolas e a melhor parte dos pomares, olivais e vinhas).

Uma finalidade imediata das centuriações era a de fomentarem a multiplicação de pequenas explorações agrícolas familiares e semi-familiares nos arredores das cidades, no sentido de garantir a sua auto-subsistência agrícola a partir da exploração intensiva dos terrenos mais produtivos. Tiveram como consequência secundária a multiplicação de casas de campo, na sua esmagadora maioria associadas às actividades agrícolas.

A centuriação estabelecia-se aquando de uma fundação ou refundação das comunidades urbanas segundo um modelo colonial especificamente romano, desenvolvido originalmente para a ocupação e distribuição de terras por veteranos militares em territórios conquistados. Este modelo aplicou-se também a territórios expropriados ou comprados para o efeito pelo Estado.

Já em províncias pacificadas há exemplos de centuriações mais tardias, levadas a cabo com o apoio das aristocracias municipais locais, no sentido de promoverem as suas comunidades e a si próprias no quadro da municipalização de Direito Latino. É este - tanto quanto se sabe - o caso de Balsa.

Deve notar-se que a centuriação deixava de fora largos tractos de propriedades imunes mais afastadas das cidades. Uma grande parte ou a maioria dos bens fundiários das aristocracias locais e de investidores romanos ultramarinos localizar-se-ia aí, sem estarem submetidos às rigorosas leis que regiam a propriedade e a exploração das parcelas centuriadas. Era também nestas zonas exteriores à pertica centuriada que permaneciam os núcleos de propriedades de agrupamentos indígenas (pagi) que mantinham uma maior ou menor autonomia de parcelamento agrário e de regimes de exploração da terra.




Sobrevivência dos cadastros romanos

A sobrevivência de vestígios de centuriações manifesta-se na regularidade ortogonal de caminhos e limites de propriedade actuais, afastados entre si segundo uma métrica romana específica, distinta da dos cadastros posteriores.
Esses caminhos e limites modernos formam troços que correspondem: ou a segmentos de limites fósseis; ou à irregularização milenária desses limites que podem ser reconstituídos por regressão linear dos eixos modernos; ou ainda ao efeito de "eco ortogonal" do parcelário cadastral posterior, que tende a dispor-se mais frequentemente com orientações paralelas ou perpendiculares aos limites previamente existentes.
Os vestígios só sobrevivem em zonas que não sofreram reorganizações cadastrais radicais posteriores. Mantêm-se melhor em zonas que permaneceram semi-abandonadas durante séculos e em que os limites antigos se mantiveram na infraestrutura de acessos modernos. Foi o caso da zona suburbana de Balsa.

Cadastro de Balsa


Em Vasco Mantas, "As cidades marítimas da Lusitânia" in Les villes de Lusitanie romaine, Paris: CNRS, 1990 pp.149-205
Vasco Gil Mantas foi o primeiro a identificar os vestígios do cadastro romano de Balsa, a partir da leitura da cartografia militar.
Em 2003 retomei essa investigação, a partir da análise numérica do cadastro rústico digitalizado de todo o litoral do Sotavento algarvio. As figuras seguintes sumarizam alguns resultados desse trabalho.

Mapa actual
Sobreposição do Cadastro actual
Filtragem dos elementos topográficos do cadastro romano. Eco ortogonal e ajustamento linear segundo as orientações ortogonais dominantes. Identificação de três zonas com orientações distintas, duas delas (Balsa e Cacela) com módulos métricos ronanos.

Caracterização do cadastro de Balsa segundo a tipologia dos tratados de Agrimensura romanos: Ager Centuriatus; Ratio Proxima; Limites Maritimi




Cadastros romanos entre Balsa e Baesuris (PDF vectorial)

Bibliografia fundamental

A incluir, se houver interesse.


Sunday, October 10, 2010

Ainda a Prospecção Geofísica de Balsa

Critique and plan for the geophysical survey of the Roman town of Balsa (Lusitania).


 
Tópicos de uma palestra sobre Balsa realizada em 2008.

Introdução

A prospecção geofísica da área de Balsa é já um projecto antigo.

A evolução das técnicas de prospecção torna hoje este processo expedito, rigoroso e relativamente económico. O seu carácter não invasivo constitui uma importante mais-valia relativamente às técnicas de sondagem tradicionais, sobretudo em zonas com uma alta densidade de ocupação antiga, como é o caso das cidades romanas.

Para além da sua aplicação na determinação de áreas e estruturas edificadas do espaço urbano é de referir também a sua aplicação a zonas ribeirinhas, hoje inundadas ou, pelo contrário, colmatadas. Embora se conheça em termos muito gerais o processo de evolução do sistema dunar e das ilhas-barreira, a prospecção geofísica é uma técnica insubstituível para tentar reconstituir a barra, o canal e a ilha-barreira antigas e tentar localizar as estruturas que, sem dúvida, existiram nesta última e sob as dunas da margem. Isso para além do bónus de eventuais descobertas do âmbito da arqueologia naval.

A realização de uma prospecção deste tipo na zona de Balsa com objectivos de conhecimento científico e patrimonial só pode ter assim o nosso total apoio.

Trata-se porém de uma iniciativa que, pela sua própria importância, está longe de se reduzir a uma mera operação técnica e o modo da sua planificação poderá ter grandes consequências para o futuro de Balsa.


O projecto de prospecção da CMT

A Câmara de Tavira apresentou em 2007, em grandes parangonas, um projecto de prospecção geofísica da Quinta da Torre d'Aires. Tive oportunidade na altura de avaliar essa intenção, suspeita de perversidade na sua forma e conteúdo.
De facto, não era clara a intenção prévia em limitar a prospecção à quinta da Torre d'Aires, e, sobretudo, em querer proceder à prospecção integral dessa propriedade.

A DPRU não apresentou então nenhuma intenção de prospectar integralmente o espaço arqueológico de Balsa nem apresentou nenhuma justificação científica para proceder à prospecção da totalidade da quinta da Torre d'Aires.

Na realidade estou convicto que essas justificações ou nunca existiram ou então são falsas.
A limitação de Balsa ou a sua identificação com a Quinta da Torre d'Aires constitui um erro arreigado, que tem sido perpetuado por publicações sobre materiais da cidade.

Não se trata de um mero detalhe mas de um erro com graves consequências, pois fundamentou a exclusão das zonas do Rato, Arroio e da maior parte das Antas do perímetro classificado de Balsa, apesar da sua conhecida ocupação arqueológica (já para não falar das Pedras d'El-Rei, onde ainda recentemente foi descoberta mais uma fábrica de salgas, a 3ª registada no local).
Como se sabe, a destruição radical das ruínas enterradas da Quinta da Torre d'Aires, iniciou-se em 1978 e que continua esporadicamente ainda hoje, embora o essencial já tenha sido eliminado.
Dos cerca de 42 ha da quinta foram revolvidos talvez mais de 30, deixando apenas escarpas e bosque, zonas marginais, logradouros, caminhos e a área urbana.

Hoje em dia, é sobretudo nas Antas, Rato e Arroio, quintas parceladas há 30 anos ou mais, que se verifica um escandaloso crescimento urbanístico em plena zona arqueológica, associado a histórias "off-the-record" sobre achados e destruições.
De facto, as moradias, piscinas e a jardinagem paisagística agressiva têm sido os principais factores da destruição recente e continuada dos vestígios de Balsa. Essa destruição prossegue com grande vigor na actualidade (2010) devido ao mercado imobiliário, que transformou a zona numa área de grandes moradias, de elevado preço.

Recentemente todo o subúrbio norte da cidade foi totalmente urbanizado (Urbanização da Luz de Tavira) sem qualquer acompanhamento arqueológico sério e está em curso a construção da derivação sul da EN-125, a escassas centenas de metros da cidade romana.

Uma análise elementar sobre os prédios urbanos definidos no cadastro elaborado na década de 1980, contrapostos às casas efectivamente construídas, assim como a evolução do crescimento das áreas implantadas, constitui um exercício revelador da metástase imobiliária em acção.

Porém, na maioria desta área, sobretudo nas Antas, não há porém indícios de destruições tão profundas como na Torre d'Aires, permanecendo uma zona de eleição para prospecções não invasivas. Existem extensas zonas intactas em pousio de culturas arvenses há décadas e existem ainda pomares tradicionais, cuja plantação implicava métodos muito menos destrutivos.


Planeamento e resultados da 1ª prospecção

Apesar de sobejamente conhecedora dos limites das zonagens destruídas e remanescentes (e contra os pareceres técnicos de membros do CAT consultados sobre o assunto), a DPRU escolheu e insistiu teimosamente em duas zonas-piloto de prospecção: uma área portuária não edificada e outra numa área já totalmente subsolada, ambas porém bem próximas de outras que lhe foram assinaladas como as mais promissoras, mas que preferiu ignorar!

Nada se descobriu – como era de esperar – nas prospecções realizadas em tais lugares votados à partida ao fracasso e permanecem também desconhecidas as proporções de estultícia e má-fé que conduziram à perda de tempo e dinheiro investidos em tão triste fiasco.

Daí em diante a CMT cobriu-se, até hoje, com um véu de ocultação e silêncio públicos sobre a prospecção geofísica e demais projectos concretos relativamente a Balsa.


Zonas prioritárias de prospecção, segundo os níveis de destruição e a concentração de traços urbanos.

O fundamento técnico-científico da delimitação e hierarquização de zonas a prospectar baseia-se na sobreposição das primeiras versões (de 2004) de quatro documentos fundamentais sobre Balsa:

    Com base na síntese destes documentos é possível estabelecer um plano sistemático e fundamentado de prospecção geofísica, tendo em conta a identificação de seis zonas críticas:


    1. Fórum e escarpa portuária.

    2. Porto. Destruições à superfície mas o nível do fundo portuário pode estar intacto.

    3. Zona da ilha barreira antiga ou prolongamento costeiro onde existiram vestígios.

    4. Zonas em risco de destruição urbana.

    5. Zonas virtualmente intactas.

    6. Zonas onde há pedidos de obras e jardinagens.

    Neste mapa, a tracejado mais grosso mostram-se os limites da Quinta da Torre d'Aires, sobrepostos aos limites urbanos e periferia da cidade romana.


    Questões a que a prospecção deve responder

    Para complementar o plano topográfico fundamentado, a operação de prospecção deveria ter objectivos técnico-científicos explícitos, no sentido de responder a questões concretas sobre o conhecimento do urbanismo de Balsa:

    1. Certificação do grau da destruição perpetrada na Quinta da Torre d'Aires 

    2. Estado de conservação da colina da acrópole até à sua base e do seu terreiro norte

    3. Verificação da hipótese da existência de um fosso a Norte, coberto por terraplanagens

    4. Estabelecimento dos limites portuários, do porto exterior e interior

    5. Fases do uso e do abandono do porto

    6. Vestígios náuticos nas lamas sob o nível de destruição agrícola

    7. Estado de conservação do traçado urbano das Antas

    8. Vestígios sobreviventes da necrópole Oriental.

    9. Linha de costa e sobrevivência de vestígios na área submersa entre as fozes das ribeiras da
    Luz e do Arroio (litoral extensível até à Torre d'Aires a Oeste e Pedras d'El-Rei a Leste).

    Relativamente ao ponto 9 deve sublinhar-se a importância da zona da ria limítrofe à cidade romana. Como se sabe, as dragagens no canal norte, junto à margem, revelaram por duas vezes materiais de construção de muros, não muito longe do local onde, também no canal, foram descobertos vestígios de estruturas e as célebres lápides referentes ao circo de Balsa.

    Sunday, October 03, 2010

    Uma síntese sobre BALSA

    Balsa foi uma cidade romana portuária da Hispânia, no Convento Pacense da província da Lusitânia. A localização actual corresponde às quintas de Torre d’Aires, Antas e Arroio, freguesia da Luz de Tavira, concelho de Tavira, distrito de Faro, no sul de Portugal.
     
    Balsa é mencionado por Pompónio Mela(DC III 1, 7), Plínio-o-Velho (HN IV 35, 116), Ptolomeu (GH: II 5, 2) e Marciano de Heracleia (PME: II, 13).
     
    Cunha moeda própria: asses de bronze e os seus divisores em chumbo (semis, quadrantes, triantes e sextantes) em meados do séc. 1º a.n.e., em alfabeto latino, com motivos marinhos (atuns, golfinhos e  varios tipos de barcos). O nome BALSA registado nestas moedas é a atestação mais antiga do topónimo.
     
    Segundo Mela (DC III 1, 7) Balsa situava-se no Ager Cúneo, uma região geográfica correspondente ao Algarve Central e Oriental modernos.
     
    É um dos ópidos estipendiários da Lusitânia, sede dos balsenses (Plínio: IV 35, 118), povo que pertencia ao grupo étnico dos Turdetanos (Ptolomeu: II 5, 2).
     
    Etapa do Itinerário de Antonino entre [B]Esuri[s] e Ossonoba (IAA: 426,1). Referida como civitas no Ravenate, entre Besurin a e Stacio Sacra (RAC: IV 43, 30).
     
    Era considerada por Marciano de Heracleia a polis mais a sul da Lusitânia (M. H.: II, 14).
    A identificação do sítio é atestada pela epigrafia encontrada no local, em que Balsensium surge três vezes, a qualificar pessoas (CIL II, 5161 CIL II, 5164) e a comunidade política (IRCP 75).
     
    As inscrições epigráficas revelam que Balsa foi um Município de Direito Latino (Ius Latii Municipium) durante o séc. II n.e., muito provavelmente promovido por Domiciano (81-96 n.e.).
     
    Todos os aspectos principais da romanização provincial estão atestados localmente: uma res publica com uma ordo decuriónica (IRCP 75); proeminência da gens Manlia (CIL II, 5161 CIL II, 5162); magistrados (duúnviro pertencente à tribo QUIRINA: CIL II, 5162); séxviros (CIL II, 13); escravos públicos (balsensium dispensator: CIL II, 5164); evergetismo (oferta de espectáculo de naumáquia e pugilato: CIL II, 13); construção colectiva de um circo (CIL II, 5165 CIL II, 5166) e de outros monumentos não identificados (CIL II, 5167); culto imperial (IRCP 90); e uma larga proporção de nomes gregos e norte-africanos.
    Um cidadão romano de Neapolis (Nabeul, Tunisia) com uma filha residente no território de Pax Iulia (Beja, Portugal) declara-se um íncola de Balsa (CIL II, 105)!
     
    O grau de romanização de Balsa pode também inferir-se dos nomes pessoais conhecidos (39 homens e 16 mulheres): 58% têm tria nomina ou são mulheres com dua nomina latinos. 71% têm um nomen romano e os restantes 27% um simples cognomen, sendo estes na sua maioria nomes gregos. Os nomes nativos em todas as suas formas (célticos ou turdetanos) são uma pequena minoria (9%).
     
    Do séc. III n.e. sobrevive um raro monumento funerário escrito em grego (CIL II, 5171), considerado por alguns como sendo cristão, e há notícia de um tesouro de moedas de Cláudio Gótico (268-270 n.e.) descoberto no esgoto de um balneário.
     
    As sigillatas e os vidros importados formam uma série contínua entre as cerâmicas Augusteias tardias (Hispânicas precoces) e as Africanas D, Gálicas e Foceenses tardias, com os últimos objectos datados do sec. VII. O pico esmagador de volume corresponde às sigillatas sudgálicas do séc. I n.e. mas o estudo dos materiais é muito limitado.
     
    A indústria de preparados piscícolas está bem documentada na cidade e nos arredores, assim como as fábricas de ânforas. Conhecem-se seis produtores de garum em Balsa através das suas marcas: AEMHEL, OLYNT, LEVGEN, IVNIORVM, IMETVS F e DASIMVSTELI.
     
    Vários testemunhos anteriores a 1978 descrevem a existência de ruínas romanas muito extensas e densas no local.
     
    Desde então o terreno arqueológico tem sido profundamente destruído por trabalhos agrícolas e pela construção de moradias suburbanas e de infra-estruturas.
     
    A exploração arqueológica é muito limitada e a maior parte foi realizada no sec. XIX, com critérios pré-científicos. Por outro lado, conhecem-se sessenta sítios com achados romanos dentro do perímetro arqueológico de Balsa.
     
    A arqueo-topografia revelou estruturas urbanas extensas e importantes (ver figura 4): um teatro; um cais e um porto interior; um hipódromo; uma larga área de quarteirões hipodâmicos; e vários outros.
     
    O centro urbano tinha um tamanho extraordinário para uma cidade municipal sem estatuto de capital: os limites urbanos estendiam-se por uma área não inferior a 47 hectares e a área peri-urbana ocupava pelo menos 108 hectares. 
    O plano revela uma cidade dupla, ou então desenvolvimentos em grande escala em dois momentos da história urbana.
     
    O território da civitas correspondia ao moderno Algarve Oriental, fronteiriço da província da Bética e com uma área aproximada de 1 520 km2, na maioria constituído por serranias, então ricas em florestas e minerais.
     
    Vestígios significativos de centuriações agrárias romanas podem ainda ser reconhecidos em levantamentos topográficos modernos, limitados às planícies litorais onde os olivais, vinhas e pomares de sequeiro sempre se adaptaram melhor.
    A costa era formada por lagunas e estuários, cujos recursos agro-marítimos foram intensamente explorados na época romana.
     
    As colecções arqueológicas de Balsa estão espalhadas por diversos museus e por colecções privadas, destacando-se a do Museu Nacional de Arqueologia (Lisboa).
    Os objectos melhor preservados pertencem a espólios funerários: boas colecções de terra sigillata, vidros, lucernas e objectos pessoais, em que se destaca um estojo de cirurgião; um busto feminino da época antonina; dezassete lápides epigráficas cívicas e funerárias; estatuetas; moedas; elementos arquitectónicos, etc. 

    This information about the Roman town of Balsa, plus an extensive bibliography, may be seen in English, here.

    Saturday, July 24, 2010

    Artigo sobre Balsa

    A revista SUPER-INTERESSANTE publica no seu número 148 (de Agosto de 2010) o artigo
    Descobrir Balsa. Uma das maiores cidades romanas do seu tempo,
    por Luis Fraga da Silva.
    Ver as páginas 80 a 87.

    Versão do artigo no facebook

    Thursday, July 22, 2010

    Proposta de constituição do Centro Interpretativo de Balsa



    O Centro Interpretativo de Balsa Romana é um velho projecto do Campo Arqueológico de Tavira.

    A Associação pugna desde a sua criação pela integração de Balsa no património e programação cultural de Tavira, através da constituição desse Centro, concebido como uma estrutura de divulgação cultural, patrimonial e científica sobre Balsa e sobre a herança histórica do Algarve Romano.

    De facto, sempre se pensou ser profundamente errado e contraproducente associar ou fazer depender a divulgação pública de Balsa (e a sua integração no Museu de Tavira) dos resultados dos negócios e acordos imobiliários e arqueológicos sobre as propriedades que ocupam a antiga zona urbana.

    A memória de Balsa é um património universal, actualmente sob a guarda da comunidade municipal de Tavira. O seu conhecimento e divulgação pública não se devem subordinar nem a eventuais descobertas por realizar; nem à presença de patrimónios físicos; nem à existência incerta de financiamentos e de obras museológicas num futuro distante.

    A actividade do CIBR deve ajustar-se aos meios e condições actualmente possíveis e utilizar estes recursos para se desenvolver criativamente.

    Todos os estudos e iniciativas de divulgação sobre Balsa e sobre a herança romana da região de Tavira, realizados por membros do CAT, se têm enquadrado nesse objectivo, tendo-se consciência que só a partir de 2004 se reuniram matéria de investigação e resultados de estudos que permitem um programa de divulgação de qualidade sobre Balsa e a sua região.

    O projecto foi apresentado pela primeira vez à CCR-Algarve em 1999 e à Câmara Municipal de Tavira em finais de 2003 e - de novo - em 2005, sem se ter obtido qualquer resposta da edilidade de então, para além de uma vaga e genérica declaração de interesse.

    Com a evolução da conjuntura destes últimos anos é possível hoje redefinir um quadro mais rigoroso e limitado do projecto do Centro interpretativo, nomeadamente do seu enquadramento nas políticas culturais e museológicas do município, entretanto estabelecidas.



    O valor de Balsa na política cultural municipal

    Desde 2003 que o CAT gere o site www.arkeotavira.com na internet. A partir de uma estatística dos seus acessos desde 2005, coadjuvada pela numerosa correspondência electrónica recebida, já é possível fazer uma síntese importante e significativa dos interesses dos utilizadores:

    • O tema de Balsa – importante cidade romana desaparecida – desperta muito mais interesse a nível nacional, e sobretudo internacional, do que Tavira.
    • Tavira Fenícia e Turdetana despertam mais interesse do que Tavira Islâmica e muito mais interesse do que a Tavira portuguesa.
    • A maioria do interesse especializado sobre temas de história e arqueologia de Balsa e Tavira provém de universidades portuguesas, espanholas e brasileiras mas também norte-americanas e europeias.
    • É assustador o desinteresse sobre estas temáticas pela parte de utilizadores do Algarve, sobretudo da Universidade do Algarve e do concelho de Tavira, ambos em número insignificante.
    Estes factos permitem tirar uma importante conclusão: Balsa Romana e Tavira Arqueológica constituem os aspectos mais distintivos do interesse patrimonial e cultural de Tavira junto da comunidade mundial de internautas cultos.

    A pouca penetração do conhecimento histórico nas populações locais, mesmo das mais diferenciadas, decorre sobretudo da falta de divulgação através de meios de difusão mais tradicionais, com destaque para a existência de uma exposição permanente, para a divulgação na imprensa local, para os eventos presenciais e para a produção de programas escolares específicos, sobretudo para os professores e agentes culturais locais.

    Este capital cultural, que constitui o maior "activo" de Tavira no mercado global a médio prazo, continua, infelizmente, a ser secundarizado, ignorado e delapidado. De facto, o sucesso junto do público da campanha "Balsa,Cidade Perdida", e o interesse crescente por Balsa criado neste processo não tiveram, infelizmente, repercussões na política cultural da Câmara Municipal de Tavira, que continua a adiar indefinidamente a integração de Balsa no património cultural municipal.


    Projecto

    O Centro Interpretativo de Balsa Romana é concebido como um núcleo autónomo e especializado do Museu Municipal de Tavira.

    Congregará as funções e actividades de estudo e divulgação da história e do património da Época Romana no território da antiga cidade de Balsa e o seu enquadramento supra-regional.

    As suas principais finalidades serão as seguintes:

    • Estudo da cidade e território de Balsa
    • Estudo do contexto regional da Época Romana, no Algarve e no Sudoeste Peninsular.
    • Estudo dos sítios, vestígios e objectos da Época Romana no actual concelho de Tavira.
    • Instalação e divulgação de uma exposição permanente e de respectiva documentação, destinada a públicos diferenciados, nomeadamente na área do turismo cultural e da história local.
    • Edição periódica de um Boletim de Estudos Balsenses, destinado a artigos técnicos e científicos e a temas de interesse do público culto não especializado.
    • Programa municipal de captação da confiança de particulares relativamente a empréstimos e doações de materiais arqueológicos romanos em colecções privadas.
    • Articulação programática com os concelhos limítrofes que partilharam o território de Balsa e com os museus que guardam elementos materiais desse território.
    • Intercambio organizado com municípios portugueses, europeus e norte-africanos sobre a temática da divulgação da herança romana, com destaque para a circulação de exposições e de conferencistas.
    • Elaboração de um programa específico de formação de professores e agentes culturais, a integrar nas actividades curriculares e extracurriculares das escolas secundárias do concelho.
    • Desenvolvimento de um programa anual de actividades e de um serviço educativo, integrados nas actividades do Museu Municipal de Tavira.
    Pretende-se que o CIBR inicie as suas actividades a muito curto prazo, num sentido preparatório, experimental e progressivo.

    A sua realização é independente da existência de instalações próprias e definitivas.

    Os conteúdos museográficos terão um carácter amovível, de modo a se inserirem facilmente em iniciativas de carácter temporário e itinerante, ajustando-se aos lugares e condições disponíveis.


    O programa de realizações a curto prazo conterá:
    • Apresentação pública do projecto e do início das actividades do Centro.
    • Ciclo de palestras destinadas ao público culto não especialista.
    • Exposição temática de painéis e maquetas. Versão revista e ampliada da exposição de 2008 com publicação de folhas de sala em três línguas.
    • Elaboração de materiais didácticos destinados à formação de formadores.

    Este texto faz parte de uma proposta apresentada à Câmara Municipal de Tavira, a aguardar resposta desde  10 de Março de 2010.

    Materiais do Centro Interpretativo de Balsa




    Folheto de anúncio da exposição, revelando a disposição dos cartazes, separados por "hermas" dos principais imperadores das dinastias Júlio-Cláudia e Antonina, época de apogeu da cidade.