Thursday, January 18, 2007

História de Balsa - 1

A Cidade
Balsa foi uma importante cidade romana, que existiu na freguesia de Luz (concelho de Tavira, distrito de Faro), nos terrenos litorais hoje designados por Torre d’Aires, Antas e Arroio, tendo Pedras d’El-Rei, Luz, Rato e Pinheiro como subúrbios.
É citada nas listas de cidades do Império Romano (por Pompónio Mela e Plínio-o-Velho, no séc. I d. C. e por Ptolomeu, no séc. II), posteriormente como etapa de um dos Itinerários de Antonino (roteiro de estradas e rotas navais do séc. III) e, já após o fim do Império do Ocidente, na Cosmografia do Anónimo de Ravena (séc. VII, mas baseada em documentos muito mais antigos).

A história urbana de Balsa romana inicia-se no séc. I a. C. e termina no séc. V ou VI da nossa era. Teve o seu apogeu urbanístico no século II, chegando a ocupar uma área de cerca de 45 hectares (ha), excluindo subúrbios e necrópoles.
Era assim uma cidade de considerável dimensão no Império Romano, muito acima da média urbana da província da Lusitânia, a que pertencia.
Destacava-se relativamente a Olisipo (Lisboa), Ossonoba (Faro) e Conimbriga (Condeixa-a-Velha, Coimbra), então respectivamente com 29, 28 e 23 ha, e era oito vezes maior do que os 5.5 ha da zona amuralhada de Tavira medieval!

Cidade portuária litoral, sede de civitas, isto é, de uma autonomia municipal, que abrangia todo o Algarve Oriental entre Bias e o Guadiana, cunhou moeda própria em meados do século I a. C., no início da ocupação romana efectiva.

Origens
O seu nome é de provável origem fenícia, tal como o de outras cidades romanas do sul peninsular, como Gades (Cádis), Baelo (Bolonia), Carteia (San Roque) e Malaca (Málaga).
O primitivo povoado fenício localizava-se em Tavira, no morro de Santa Maria (Figura 3), onde existiu entre os séculos VIII e VI a. C., altura em que foi violentamente destruído.
O sítio chamar-se-ia originalmente B'LŠ[..], correspondendo ao nome de uma divindade fenícia.

O fim da ocupação fenícia provocou um abandono temporário do local, que voltou a ser ocupado em meados do Séc. V, transformando-se então num florescente povoado piscatório, conserveiro, metalúrgico e comercial, ligado ao apogeu do "Círculo do Estreito" e ao período tartésico (assim chamado em honra do mítico reino encontrado pelos navegadores gregos aqui no Extremo Ocidente).
Esse povoado é designado "Tavira turdetana" pelos arqueólogos e correspondeu à fase de Balsa Tartésica.
Na 2ª metade do Séc. IV o sítio sofreu uma série de ataques e profundas destruições, acabando por ser de novo abandonado. Esta fase de violência, que atingiu todo o Golfo de Cádis, marca o fim do período Tartésico e o início da influência cartaginesa.

Após o abandono, o centro do povoamento transfere-se para o sítio do Cerro do Cavaco, um pouco a Norte de Tavira. Neste local, que foi amuralhado, encontraram-se os indícios mais significativos dos séculos III e II a. C., nomeadamente alguns dos vestígios romanos mais antigos do território português. Infelizmente a zona arqueológica foi recentemente destruída, antes de ter sido convenientemente explorada.
A entidade territorial de então, pequeníssimo Estado independente, chamar-se-ia já Balsa, nome por que aparece referida pela primeira vez nas moedas no séc. I a. C.
Pensa-se que Balsa, assim como outras comunidades turdetanas do litoral tenham estado submetidas de algum modo ao poder cartaginês. Permanece obscura a sua relação com os Cónios, povo que dominava o Baixo Guadiana e o Algarve Oriental aquando da chegada dos romanos e que constitui a única entidade política organizada registada nas fontes da época.

Romanização
Pensa-se também que o primeiro enclave portuário romano, no sítio da Torre d’Aires, só tenha sido fundado na sequência da "Guerra dos Piratas" de 67 a. C, comandada por Pompeu Magno.
O seu legado (lugar-tenente) encarregado das operações na área atlântica foi Tibério Nero, pai do imperador Tibério. A parte naval da campanha terá porém estado sob o comando de Lúcio Manlio Torquato. Este e o seu irmão Tito Manlio Torquato, outro comandante de Pompeu, pertenciam a uma antiga estirpe senatorial romana, célebre desde os tempos semilendários do ataque gaulês a Roma, em 387 a. C. Era uma família de almirantes que se distinguiu na 2ª Guerra Púnica e já com interesses na Hispania desde então.
Será a partir desta época que os Manlii expandem esses interesses navais e fundiários na área do Golfo de Cádis, cujas ramificações locais encontraremos em Balsa duzentos anos mais tarde.
Os legados pompeianos terão sido responsáveis, nos anos seguintes, pelas cunhagens de moeda em várias cidades da zona, entre as quais as de Balsa, Ossonoba e Baelo.

Os elementos conhecidos indicam que os balsenses terão tomado o partido de Pompeu Magno na guerra civil que o opôs a César. De facto, a representação de barcos de guerra nas moedas balsenses indicia ter constituido uma força naval auxiliar (isto é, constituída por indígenas não romanos) durante ou após a "Guerra dos Piratas".
Os balsenses integrar-se-iam assim na extensa rede de povos marítimos clientes de Pompeu e dos seus filhos, numa zona que manteve a sua lealdade até à derrota final desse partido.
Os vestígios mais recentes do povoado do Cavaco (a Balsa pré-romana) são desta época. Desconhece-se quando foi abandonado mas é mais provável que o tenha sido por ordem dos legados de César ou de Augusto, tal como sucedeu em muitos outros lugares.
As derrotas de Pompeu por César em 45 a. C. (na batalha de Munda) e, posteriormente, do seu filho Sexto por Marco Agripa e Octávio (Augusto) em 36 a. C. (na batalha naval de Nauloco) foram determinantes para o destino dos balsenses e de inúmeros outros povos e cidades. A comunidade indígena foi reconstituída no novo local romano de Balsa, sob a forma de uma civitas estipendiaria. Esta era a forma romana da servidão tributária, reservada aos indígenas que assumiram uma posição hostil ao partido romano vencedor.

Neste grau mínimo de autonomia, a comunidade sobrevivia devido ao arbítrio e interesse do poder romano, sem direitos políticos, civis e fundiários, regendo-se internamente pelas suas leis ancestrais.
A despromoção a civitas estipendiária, acompanhada da mudança forçada de assentamento para um lugar que se manteve pobre e pequeno até meados do séc. I da nossa Era, revela o castigo dos balsense, sem dúvida originado por uma resistência armada pró-pompeiana. Terá sido uma situação semelhante à então ocorrida nas cidades da Sicília, pelos mesmos motivos.


1 comment:

José Cavalheiro said...

Luís.
Que vestigios se podem ver ainda hoje á luz do dia.
Vou varias vezes a tavira, e tenho encontrago dentro da cidade alguns vestigios , como o que se encontrou no acesso ao castelo.
Fica bem.